sábado, 30 de junho de 2012



o sono não vem
nesta madrugada fria
a lua crescente

na tua pele de pêssego
um pássaro se protege


**


depois da garoa
misturada às folhas secas
este silêncio

um perfume volta à cena
que só em palavras ou sonhos




tarde escaldante
em pleno inverno se faz
presente ainda

nada se move senão
o leque em teu suado rosto


**


recado da ave -
o cão ao longo da cerca
entre sol e chuva

fazem parte dessas vozes
outros pássaros e o vento




filigranas

sexta-feira, 29 de junho de 2012


entardecer
ao lado dos trilhos de trem
a árvore seca

em algum lugar da rua
há uma folha que se move




Vídeo Haiga c/ Tankas de Jiddu Saldanha

Caja de Musica de Pedro Aznar - TANKAS - Poemas de Jorge Luis Borges



Jardim Japonês em Buenos Aires - maio de 2012

Trevas


suspensos jardins -
sob as brumas da manhã
rompe o céu o monte

encontro um manto de seda
enredando-me em silêncio






há melancolia
nesta noite fria sem lua
nas folhas da nogueira

um grilo desesperado
canta madrugada adentro


**


lua de inverno
esperando a luz da aurora
não percebo o céu

nem teu rosto adormecido
ao escolher os poemas


**


através de tudo
e em meu caminho se põem
brumas da manhã

não abandona o vasto monte
essa lua que vivencio




quinta-feira, 28 de junho de 2012




sob os jambolões
à sombra de todos eles
meu carro imóvel

sobre as folhas espalhadas
descarrego minhas coisas


**


não há refúgio onde
eu possa me recolher
sem ser perturbado ?

o vento sopra do oeste
e a tempestade está próxima


**


na varanda fria
da velha casa de praia
meu rosto envelhecido

atormentam minha tarde
as velhas recordações


**


ocaso de inverno -
na vastidão de outros tempos
a calma dos dias

nunca me esquecerei
da solidão que a névoa traz


**


a lua para mim
já se mostra na varanda
e eu tento abraçá-la

não sonho profundamente
nesta madrugada fria


**


ervas no orvalho –
é o inverno chegando cada
vez mais extremo

como eu posso não ter visto
o verso em seu coração ?


**


três anos se passaram
e a cada inverno ainda 
muitas recordações

no amanhecer enevoado
não consigo ver o céu





palavras ao vento
mas apenas um aceno
em sua passagem

através da janela
o táxi vai embora


**


tarde nublada
uma chuva aqui outra acolá
até o final do dia

ainda aguardo o telefonema
para aquele café


**


nesta noite fria
apenas a lua crescente
se mostra prá mim

adormeço sobre o livro
em minha varanda





com tijolos de barro
o pedreiro e o servente encobrem
o sol desta tarde

começa a escurecer
o céu sobre a cidade


**


ao frio da estação
junta argamassa o pedreiro
com as mãos empedradas

no jardim abandonado
as gérberas florescem


**


roupas no varal
secam ao sol da manhã
os galhos da amora

as nuvens lentamente
encobrem todo o jardim


**


no jardim japonês
tendo a flor como suporte
esta borboleta

mesmo por pouco tempo
contemplo toda solidão


**


andorinhas-do-mar
sobre os barcos atracados
em minha fotografia

na mais profunda solidão
um périplo de imagens


**


nesse papel
após o ribombar do trovão
o crepúsculo jorra

o olhar transcende
a cortina da janela


**


à deriva o olhar
do pássaro sobre os ramos
em silêncio se faz

é preciso ouvir o ruído
que há dentro de nós



quarta-feira, 27 de junho de 2012




o dia desliza
ao crepúsculo escaldante
por trás da lagoa

um céu para contemplar
no vôo da garça


**


cesto de bambu –
apenas um pouco de chá
de erva-doce

voa dentro da gaiola
o cardeal solitário


**


rua sem saída –
entre pedras e urtigas
o crisântemo branco

sempre no mesmo lugar
a lâmpada da rua


**


janela do quarto
o sol batendo em meu rosto
mas meus pés gelados

lembro da minha infância
indo à escola de manhã


**


vestido de seda
nuvem névoa sobre o monte
esgueirando-se na noite

espero a sua chegada
no portão de casa


**


marias sem vergonha
deixam-me de bom-humor –
ah ! este resfriado !

o chuvisco frio da manhã
através da vidraça


**


café no jardim –
as folhas dos jambolões
continuam a cair

o caminho que sigo
é o bando de tapicurus





a lua impede
o sono das estrelas
que contemplo

a noite é solidão
no tufo de grama


**


trevas ao meio-dia –
o alvoroço voraz
da cigarra

entre a violeta e o girassol
tormenta crescente


**


seixos rolados:
fio d’água empedra
o olhar da libélula

a noite inteira esperei
aqui por ela


**


sopro de vida –
o céu atenua
qualquer estrela

o mar de ardósia
cobre toda a areia


**


céu nácar –
a gérbera é o equilíbrio
do colibri ?

lacraias de seda
atrás do biombo


**


álacre vôo
da borboleta –
no bambuzal

o canto do rouxinol
assola o girino


**


lanterna de resina –
fita alegria no céu
a pálpebra púrpura

numa ciranda plumária
a noite se esquiva


**


ramagens –
filigranas de prata
parpadeando o céu

uma mínima lua
é quase nada ?




cortina de seda -
na varanda o vento ruge
e ao luar se entrega

o orvalho faz brilhar
o jardim tocado pela brisa








à tardinha
o que voa baixo
pousa sobre os juncos

aroma de lótus noturnos
dormitam em sonhos



garças na tarde
sobre os aguapés -
brincam na bruma

e o céu de outono
é mais claro e silencioso